domingo, 9 de novembro de 2008

O último chilique final

Se você é um viúvo da Mk2, passe sua melhor camisa preta neste domingo e guarde luto. Há 15 anos, neste mesmo dia, ficou cristalinamente claro que seria inviável Ritchie Blackmore continuar na banda. Pouco mais de uma semana depois, ele saiu, embora já tivesse pedido demissão em 30 de outubro. (Aguarde o post do dia 17 para mais detalhes.)

A noite de 9 de novembro de 1993 - registrada originalmente no CD e no DVD "Come Hell or High Water" - foi aquela em que a fricção entre Gillan e Blackmore fez surgir o fogo. Ou a água, se preferirem. Blackmore entrou no palco na metade de Highway Star e sumiu no começo de Black Night. Jogou água no câmera. O homem estava com a macaca.

Nos últimos cinco anos, este blog juntou todas as versões que encontrou a respeito daquela noite fatídica. Em setembro, cheguei a conversar, em Copenhagen, com o megafã Rasmus Heide, autor de uma completa e empolgante, porém triste resenha feita para o The Highway Star. Ele estava lá naquela noite. E foi ele quem viu a cena que eu li pela primeira vez quando foi escrita pelo Gillan em sua autobiografia:

    When Blackmore finally did appear, it was only to leave the venue. He was disguised in his roadie's medieval peasant's outfit (which has since formed the basis of his dress code with Blackmore's Night!) and his girlfriend lead him to the door by way of a dog collar and leash. Very strange.

No ano passado, traduzi neste blog três versões sobre o caso da água. Uma era da autobiografia de Ian Gillan; outra, do website de Candice Night (possivelmente a moça que puxava Blackmore pela coleira); a terceira, do Darker Than Blue, fanzine da DPAS.

Eu tenho o vídeo (em VHS) e o CD daquela noite. Está longe de ser minha performance favorita do Deep Purple. O DVD é editado com entrevistas em que os quatro remanescentes falam mal do Blackmore - algo como a mais comentada do que vista edição do debate do Lula com o Collor em 1989.

A EMI tentou relançar o CD com o show completo, mas em fevereiro do ano passado o Ian Gillan chiou a respeito. Disse ele à BBC:

    "Foi um dos pontos mais baixos da minha vida. De todas as nossas vidas, aliás. De fato, aquela formação só durou cinco ou seis shows depois daquele de Birmingham. Aí, o Ritchie saiu da banda. Desde então, temos 13 anos de estabilidade."

O protesto do Gillan fez efeito. Hoje, você não encontra o DVD de "Come Hell or High Water", novo, por menos de R$ 60 nas principais lojas especializadas. O CD desapareceu feito fumaça. E o CD com o show completo, só em ponta de estoque. No site da Livraria Cultura, custa R$ 90.

Desde a primeira vez em que vi o show, apenas uma parte dele me abre um largo sorriso. Não é nenhuma música do próprio Deep Purple, e sim dos Rolling Stones: "Paint it Black". Eles tocavam isso no início dos anos 70 para o Paice fazer um longo solo de bateria e os outros descansarem um pouco ou talvez irem pra baixo do piano com alguma fã mais empolgada. Em 1993, a música virou uma vitrine dos talentos de cada um dos mestres.

Blackmore esmerilha sua guitarra. Lord põe seus dedos pra dançar sobre o teclado de seu brinquedo favorito. Gillan sorri enquanto surra as congas. Glover, sempre discreto, toca as mesmas duas notas que tocava aos 25 anos pra garantir uma base firme pra piração dos amigos. E Paice bota pra trabalhar os pigmeus percussionistas que traz escondidos sob sua manga. Vá lá que o Blackmore desapareça durante a maior parte do tempo, quando devia trocar solos com o Lord, e volte só no final. Mas aí todos eles estão completamente à vontade fazendo o que sabem fazer melhor.

É esse o Deep Purple para o qual eu tiro o chapéu desde a adolescência:

3 comentários:

  1. Tenho esse DVD.
    Blackmore parece que está com preguiça de tocar a maioria das músicas ... ele queria "vazar" o mais rapido possivel.
    Grande post.

    Aguardando ansiosamente o do dia 17.
    Um abraço.

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  2. Bem,você é um fã e tanto do Purple,hein?
    Mas o último chilique final...
    Se é final já não é o último e se é o último já não é o final??? >.<"

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  3. Carolina, em se tratando do Blackmore, nada é muito previsível, nem mesmo semanticamente. Ele já havia dado um chilique final em 1975, quando saiu do Purple pela primeira vez. Aquele de 1993 foi seu último chilique final na banda. Mas, mesmo sendo um chilique final, certamente também não foi o seu último chilique. Se bem que agora ele terceiriza. Certa vez um jornalista sueco foi entrevistá-lo e puxou uma caixa caríssima caixa de CDs do Deep Purple pra ele autografar. Sua empresária e sogra saltou sobre a caixa, confiscou-a, cancelou a entrevista e prometeu que nunca mais o mestre daria entrevistas para jornalistas suecos.

    Mas o título é uma homenagem obscura a um vídeo feito em 1996 por colegas meus na Universidade Federal do Rio Grande do Sul. "O Último Confronto Final" era um faroeste estrelado por bonequinhos Playmobil que atiravam uns nos outros com munição de voz ("pióim!"). O negócio era tão meticulosamente tosco que era genial para o que se propunha.

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