quinta-feira, 16 de janeiro de 2003

Purple e Roxette

Recebi um email do Ronaldo, fã do Deep Purple e do Roxette. Ele pergunta o que eu acho do Roxette. Vou desenvolver a idéia contando a história. As linhas abaixo foram primeiro mandadas para o Ronaldo, por email. Presumo a concordância dele com a publicação aqui, até porque a história é engraçada. Depois, prometo que conto a de quando eu apertei a mão do Gillan, três dias depois dessa do Roxette.

Não sou fã do Roxette, mas curto um pouco. Eu ter bancado o intérprete deles foi uma casualidade: eu fui à loja comprar uma palheta e tinha uns caras com cabelo esquisito por lá, se desentendendo com o caixa:

-- Mais alguma coisa?
-- What?
-- Mais... alguma... coisa?
-- What? I cannot understand you.
-- MAIS... ALGUMA... COISA?
-- Wh..?

Aí eu cutuquei o gringo, em inglês:

-- Ele tá perguntando se vocês querem mais alguma coisa.
-- Ah, bom. Não, não queremos.

E para o caixa:

-- Ó, eles não querem mais nada mesmo.
-- Pô, tu caiu do céu. Leva eles até o caixa pra mim!

Levei os três caras até o caixa. Um usava um rabo de cavalo. Outro usava o cabelo comprido espetado, à la The Cure. O outro eu não lembro direito. Conversei mais com o de rabo de cavalo, que era o baterista. Os outros dois eram o baixista e o tecladista. Eles explicaram que eram da banda de apoio do Roxette, e que ficaram extremamente agradecidos pelo meu apoio.

Ia ter show deles no Gigantinho naquela noite (era uma quarta-feira, no começo de maio de 1992; no sábado, dia 9, teria show do Ian Gillan), e eles perguntaram se eu ia. De cabelo comprido, com a calça jeans cuidadosamente rasgada no joelho e jaqueta cheia de patches do Deep Purple, Sepultura, Iron Maiden e Slayer, era mais ou menos claro que eu não ia. Mas fui polido: "tô meio sem grana..." E ele: "não tem problema, a gente te dá o ingresso". Aí é que eu fiquei constrangido. Aceitei; ia guardar como souvenir.

Entrei com eles no hotel, pela garagem. Fiquei esperando na recepção enquanto o cara ia buscar o ingresso. Do lado de fora, dezenas e dezenas de fãs (como sói acontecer na frente de hotel nessas épocas de show, e nessas eu tirei uma foto com o Ronnie James Dio e peguei autógrafo do Bruce Dickinson). Os caras me trouxeram o ingresso e perguntaram se eu sabia como ir até o Gigantinho. Disse que sabia, afinal de contas a cidade era minha. "Ué, se quiser uma carona pode ir com a gente", eles disseram. No meu quase-talibanismo metálico, dei uma desculpa simpática e recusei. (Hoje eu aceitaria, mas não espere muito bom senso de um metaleiro de 15 anos.)

Saí com o meu convite dentro da carteira e fui cantar o ovo. Cheguei à Megaforce, a loja de discos e apetrechos heavy metal que Porto Alegre tinha na época. Mostrei para os caras: "olha só o que eu ganhei do Roxette". Era um convite especial, da cota das distribuições da banda. Um dos caras da loja ficou vidrado, porque a noiva dele ia ao show e ele não. Tanto ele me encheu o ouvido que eu troquei com ele por um vinil (na época era o padrão, e eu não tinha aparelho de CD). Do Deep Purple: o grande Machine Head. Até hoje eu guardo esse vinil com o "presente do Roxette" escrito em caneta azul na capa interna.

Se fosse hoje eu não trocaria. Pelo contrário: teria ido ao show de carona com eles. Mas na época me pareceu um bom negócio. Eu não iria ao show, talibã como era. O ingresso ia ficar ocioso na minha carteira, e vai que eles fossem conferir se foi usado. Ficariam chateados de não ter sido usado. A gratidão permaneceu. E pela primeira vez tive em casa aquele clássico do Deep Purple. Hoje tenho a versão em CD duplo, remasterizado, com faixas extras, livreto especial e o escambau. Mas aquele vinil está ali bem guardado, embora eu não tenha mais onde ouvi-lo.

[Vi que tivemos vários acessos de um fórum do Roxette. O pessoal está achando que fui trouxa de trocar por um disco. Hoje em dia, claro que eu escolheria diferente. Mas na época, considerando todas as condições - inclusive e principalmente meu talibanismo metálico -, não achei grande problema. Até porque moro do outro lado da cidade e não tinha grana nem pra voltar de táxi à noite. No show do Iron Maiden, em agosto daquele ano, eu voltei a pé, levei três horas. Mas Iron Maiden era Iron Maiden.]

Nenhum comentário:

Postar um comentário